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Telemedicina: o que precisamos regular (ou não) para o desenvolvimento da medicina à distância

Lideranças de negócios disruptivos na saúde opinaram sobre o andamento do debate sobre a regulação da telemedicina feito pelo Conselho Federal de Medicina. Um dos temas mais quentes relevantes e atuais

 

Uma recente pesquisa pela consultoria KPMG mostra que, do total de executivos dos mais diferentes setores da economia, 71% disseram que a pandemia acelerou (e muito) os projetos digitais. No entanto, poucos segmentos aceleraram tanto na transformação digital quanto a saúde no Brasil. Após a autorização provisória às pressas de uma lei federal, que concedeu provisoriamente a medicina à distância ou telemedicina, startups e grandes empresas montaram grandes estruturas para atender o paciente à distância quase da noite para o dia. E o resultado foi animador.

Em pouco tempo, o consumidor aprendeu e gostou da medicina à distância. Outra pesquisa, desta vez feito pela Capterra, plataforma de busca e comparação de softwares, ouviu 1.004 pessoas em todo o país e identificou que 55% já usaram os serviços de consulta médica a distância. Mais do que isso, 46% dos entrevistados que já experimentaram o serviço pretende continuar utilizando-o ou aumentar o uso mesmo após o fim da pandemia e a normalização do convívio social.

No entanto, muita coisa ainda pode mudar quando o assunto é telemedicina. O Conselho Federal de Medicina (CFM) ainda precisa regulamentar ou detalhar como será a medicina à distância no País. Para isso, eles vêm discutindo os detalhes de uma resolução a partir da revisão da Resolução CFM 1.643/02. Mas o que está em jogo nesse debate? Quais os desafios?

Territorialidade e LGPD

Para discutir o assunto, o Comitê de Healthtech e Wellness da Associação Brasileira Online to Offline (ABO2O) promoveu, no último dia 16 de Março de 2021, uma live no Youtube sobre o tema da telemedicina. O foi realizado com o apoio da plataforma INOVATIVOS e do Grupo Innovation Xperience.

A mediadora do encontro foi Paula Mateus, Líder do Comitê Healthtech e Wellness da Associação e gerente na relação com hospitais na healthtech Saúde iD, que pertence ao Grupo Fleury. Ela convidou para a mesa redonda Renato Velloso, CEO do DR. Consulta, Carlos Pappini, CEO na Conecta Médico, Jamil Cade, CEO W3 Care e Pedro Marton Pereira, CEO na ePHealth Primary Care Solution.

O debate foi intenso desde o início. Paula afirma que a telemedicina é importante para o Brasil, muito embora a aprovação da regulamentação está atrasada. Segundo ela, havia a promessa de uma norma em março. “Era para sair em março e não houve nenhum anúncio ainda. Temos que parar a discussão sobre a prática (médica) para passar para uma discussão de regulação das plataformas”, afirma.

Paula, então, questionou os convidados sobre os temas no centro do debate de uma autorização definitiva. 

Pappini, que vem acompanhando de perto os debates sobre o tema no CFM, afirma que existem três pontos importantes na construção de uma regulamentação. Uma delas é a questão do território, ou seja, qual é o verdadeiro limite da atuação do médico na telemedicina. “Havia a discussão se um médico em São Paulo poderia ou não atender um paciente no Rio Grande do Norte. Isso basicamente foi superado, mas a questão não é apenas o atendimento. Existe a limitação da prescrição (de medicamentos) também. Uma receita médica de São Paulo não pode ser aviada para o Rio de Janeiro. Sinceramente, isso não faz muito sentido, em 2021”, explicou.

Pappini ainda destacou o debate da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no contexto da telemedicina. Para isso, segundo ele, a regulamentação deve prever parâmetros mínimos de segurança da plataforma de medicina à distância para evitar, entre outras coisas, os vazamentos de dados dos pacientes – classificados pela lei como sensíveis.

Primeira consulta

No entanto, o assunto que realmente esquentou foi o tema da primeira consulta. Alguns conselheiros do Conselho Federal de Medicina defendem que a primeira consulta seja presencial – ao menos preferencialmente. A telemedicina entraria a partir da segunda consulta cuja cobrança, normalmente, não ocorre.

Na avaliação dos especialistas, essa visão da CFM é preocupante. Primeiro porque seria um risco, neste momento, defender a ideia de uma visita presencial ao médico em meio a uma pandemia como o novo coronavírus. “Penso que a decisão cabe ao consumidor. Sobre a primeira consulta episódica (dar orientação ou atender uma pessoa com problemas simples) ser presencial, penso que a pandemia já respondeu isso. Se a primeira consulta for presencial, logo não precisaríamos de telemedicina. É uma questão ilógica termos que ir primeiro para um pronto-socorro. A regulação deveria partir para um ponto um mais tecnológico e eles não entraram nesse mérito”, afirma Paula.

Velloso, do Dr. Consulta, destacou que a ideia por trás da telemedicina é ampla e permite diversas “telemedicinas”: há desde a segunda opinião do médico até a emissão de um laudo à distância, passando ainda por situações pós-cirúrgicas. “No Brasil, hoje, temos dois tipos de telemedicina: o episódico, que é a grande maioria dos casos, e aquela consulta que mais parece uma triagem, onde o paciente vai saber se precisa ir ao médico presencialmente ou deve se dirigir a um hospital. Há ainda a telemedicina com desfecho clínico, que é aquela que a gente faz”, explicou.

Jamil, da W3 Care, trouxe ao debate a importância sobre o uso de indicadores de satisfação do cliente, algo muito comum nos setores financeiros e de telecomunicações, mas pouco aplicados na medicina. Um deles é o Net Promoter Score (NPS).

“Muitas vezes utilizamos o serviço de saúde presencial simplesmente para tirar uma dúvida ou um questionamento, algo que você poderia fazer por telemedicina. Em 80% dos casos a gente consegue resolver sem problema nenhum. Os outros 20% dos casos dependem da decisão do médico, sendo a primeira consulta ou o retorno. Ele (médico) precisa ter a lucidez e a ética de falar: ‘a gente não consegue resolver por aqui, então, por gentileza, venha presencialmente’”, afirma.

Paula, da Saúde ID, afirma que a autorização definitiva precisa levar em conta a preferência do consumidor. Ela ainda destacou que a discussão sobre a regulação deveria estar focada na definição de critérios e parâmetros para as plataformas digitais. “É preciso parar a discussão sobre a prática e passar para a regulação das plataformas. Como médica, eu defendo a criação de um Procedimento Operacional Padrão (POP) para que possamos dizer em que momento devemos ou não usar a telemedicina”.

Já Pappini opinou sobre a remuneração pelos serviços dos médicos e discordou sobre a tese sobre as diferenças entre os serviços online e offline. O que muda, segundo ele, é o meio de comunicação entre paciente e médico. “A ABO2O traz muito isso da convergência do online e o offline. Temos que fomentar cada vez mais esse tema, pois penso que temos que remunerar o desfecho ou qualidade do serviço e não se é online ou offline, ou se é a primeira consulta ou não. Penso que o debate sobre o tema está indo bem e isso está sendo superado”, explicou.

“Precisamos olhar e aprender com o nosso vizinho de regulação, o setor financeiro. Se cada banco definisse o seu próprio PIX, isso aqui ia virar uma bagunça. Se o Banco Central quisesse ser uma fintech, talvez seria uma bagunça. O BC foi importante para o sistema quando definiu a linha-mestre de como faz um PIX. Feito isso, cada um oferece o seu produto, coloca os seus preços e faz o seu atendimento ao usuário. Temos que olhar muito para o nosso vizinho, que lida com informações sensíveis, é super regulado, mas está conseguindo inovar”, com concluiu Pedro Marton Pereira, CEO na ePHealth Primary Care Solution.

 

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