Inovação Digital e Tecnologia na Centralidade do Cliente

Swipe, Tap, Done: a ascensão das carteiras digitais nas relações de consumo

Em um café, restaurante ou mesmo em uma loja, a cena se repete: o cliente manuseia o smartphone, faz alguns movimentos e aproxima o aparelho da máquina para pagar. Tudo é muito rápido, instantâneo e, sobretudo, uma grande experiência.

Ao mesmo tempo, dentro da sua carteira, as cédulas de R$ 20 ou R$ 50 parecem percorrer um caminho inverso: o do esquecimento. O dinheiro físico assumiu um caráter emergencial na economia do cotidiano, uma espécie de “plano B ou C” na hora da compra (ou quando a maquininha do comércio não funciona). Além disso, não seria um exagero apostar que a cédula de Real (RS$) poderia ter um destino semelhante às notas de US$ 1, que andam escondidas nas carteiras de milhões de brasileiros como se fossem um símbolo quase espiritual de prosperidade.

O fato é que dinheiro ou um cartão de débito tradicional caminham para se tornar relíquias de antiquários onde, ao mesmo tempo, as carteiras digitais – e o próprio PIX – ganham cada vez mais espaço no cotidiano de consumo. De acordo com dados do estudo “The Global Payments Report 2024”, da Worldpay, carteiras digitais responderam por 16% dos pagamentos no e-commerce brasileiro em 2023, com projeção de 28% até 2027.

No mundo, esse percentual é diferente. Considerando os mercados asiáticos, europeus e norte-americano, a presença de carteiras digitais no comércio eletrônico já rompeu os 50% e continua acelerando. Até mesmo na Argentina, nossa vizinha, o percentual é superior a 30%. Mas por que esse sucesso não ocorreu por aqui?



Pix não é uma carteira digital?

Para especialistas, a “culpa” é do Pix.

Lançada há cinco anos, a tecnologia rapidamente ganhou popularidade e já é usada por cerca de 70% dos brasileiros, movimentando trilhões de Reais em 2024. Porém, ao contrário do que muita gente vivencia em uma compra no mercado ou outro comércio, o Pix não é uma carteira digital – e isso pode ofuscar todos os benefícios de uma e-wallet para o consumidor.

Segundo Thiago Medeiros, diretor de desenvolvimento de negócios da Worldpay e experto no assunto, existem basicamente três tipos de carteiras digitais. O modelo mais comum é a “carteira de passagem“, que faz uma espécie de versão digital e tokenizada dos cartões físicos, utilizando a rede das bandeiras para pagamentos. O celular funciona como intermediário, sem armazenar saldo, apenas replicando as funcionalidades do cartão físico. Em outras palavras, é aquele cartão que você cadastra no seu smartphone para efetuar pagamento com um ou dois cliques.

Há também as “carteiras de valor armazenado“, que armazenam fundos em contas digitais, permitindo transferências entre usuários. “Aqui está uma das razões para a confusão com o Pix: como a infraestrutura do Pix é amplamente usada por essas carteiras como ‘trilho’ para movimentar recursos entre contas, muitas pessoas associam o próprio Pix a uma carteira digital. Na realidade, o Pix é um sistema de pagamento instantâneo (não uma carteira), que pode ser integrado a diferentes plataformas – inclusive a essas carteiras – para viabilizar transações.”

Por fim, existem as “carteiras escalonadas“, que operam em redes próprias, como o PayPal. Nessas carteiras, as transações ocorrem dentro de um ecossistema fechado, utilizando saldos da conta ou cartões vinculados à plataforma.



Carteira digital é experiência em pagamentos

No Brasil, as carteiras digitais, especialmente as de passagem, são as mais populares em substituição aos cartões físicos, segundo explica Thiago. “Inicialmente, muitos brasileiros evitavam utilizar a versão tokenizada dos cartões devido a receios equivocados relacionados à segurança. Atualmente, os consumidores estão mais bem informados e muitos se sentem atraídos pela conveniência e pelas camadas adicionais de segurança oferecidas por esse tipo de wallet”, explica Thiago.

Um estudo da Croma Consultoria aponta que o PayPal é a carteira digital mais utilizada no Brasil, sendo citada por 52% dos usuários. O índice é ainda maior entre a classe alta, atingindo 71%. PicPay e Mercado Pago aparecem empatados em segundo lugar, com 33% de intenção de uso cada. O PicPay se destaca na classe A, citado por 42% dos entrevistados. Já o Mercado Pago é a escolha de 43% da Geração X.



Carteira digital é uma nova experiência

O mesmo estudo ainda mostra que a adoção das carteiras digitais está associada a uma transformação cultural no comportamento financeiro dos brasileiros, que ocorre a partir da somatória de fatores como a digitalização da economia, além das necessidades de comodidade e experiência. Os mais jovens querem soluções que combinem praticidade, segurança e inovação, enquanto os mais velhos veem nas carteiras digitais um caminho para adaptação ao mundo digital.

Nas empresas, esses novos comportamentos já impactam as empresas e estimulam mudanças na governança cliente-cêntrica, especialmente na hora da compra. No Banco Carrefour, por exemplo, o percentual de transações conhecidas como contactless, ou seja, aproximando um cartão ou smartphone – o que inclui a carteira digital –, já representa metade das movimentações da instituição financeira.


“Eu sou sempre otimista em relação ao futuro, acho que tem muitas inovações surgindo, muitas tecnologias surgindo e eu acho que tem uma preocupação muito forte com experiência de cliente, experiência do usuário, principalmente com o boom da digitalização da população pós-pandemia. Hoje, para a gente ter noção, 50% das nossas transações já são contactless“, explica André Tonelini, diretor executivo do Banco Carrefour.

No entanto, a experiência de pagamento é apenas um das vantagens das carteiras. Na verdade, a tecnologia tem potencial para se tornar um hub com as mais variadas experiências financeiras, que incluem programas de fidelidade, agregador de outros serviços e até ações de marketing, entre outras.

A Starbucks, uma das pioneiras na adoção de carteira digital, obteve resultados significativos com seu aplicativo móvel, que permite aos clientes fazer pedidos, pagar e receber recompensas usando seus telefones. O aplicativo é responsável por mais de 40% das transações da empresa nos EUA e ajudou a Starbucks a aumentar a fidelidade, a frequência e os gastos dos clientes. Outro exemplo é o Walmart, que lançou sua própria carteira digital, Walmart Pay, em 2015, e a integrou a seus serviços online e offline, como coleta de alimentos, entrega e farmácia. O Walmart Pay tem mais de 150 milhões de usuários e permitiu que o Walmart oferecesse uma experiência de compra conveniente e integrada para seus clientes.

Até mesmo para ações de marketing, as carteiras podem potencializar os negócios de uma empresa. No ano passado, o Burger King enviou R$ 0,01 para os membros do Clube BK, um programa de fidelidade da companhia. Depois disso, a empresa incentivou os sócios a adicionarem mais R$ 0,24 para garantir 2 BK Franguinhos por apenas R$ 0,25 na Black Friday.



O futuro dos pagamentos

Para o futuro, a expectativa é que as carteiras digitais continuem ascendendo em popularidade entre os consumidores. Um recente relatório da Juniper Research, por exemplo, projeta que mais de 5 bilhões de pessoas terão carteiras até 2026. Até lá, as empresas tem alguns desafios pela frente.

Uma delas é o aprimoramento da integração dos meios de pagamento (cartão de crédito, Pix, carteiras digitais, transferências, entre outras) – algo recorrentemente citado por executivos financeiros. Para eles, unir os meios de pagamento em uma única solução é fundamental para aprimorar o entendimento sobre os comportamentos e desejos dos clientes.




“É interessante tentar criar, junto com os provedores, uma experiência para o cliente que seja transparente, fácil e segura, sem depender de esforços desnecessários para fazer o sistema funcionar. Hoje, há espaço para melhorias na interação entre as empresas e os provedores de pagamento.”, opina Julia Salgado Chagas, CFO da Buser.



“Orquestrar todos os diferentes sistemas em diferentes etapas do seu cliente, de forma que ele tenha uma experiência completamente sem fricção, é onde está o desafio. Por outro lado, ao mesmo tempo, talvez esteja o gargalo com a maior oportunidade. Vejo que poucas empresas têm uma jornada de pagamentos que seja realmente fluida e com pouca fricção”, explica Leonardo Ferraz, head de FP&A do Magalu.



O futuro dos meios de pagamento também passa por ideias como “pagamentos invisíveis” ou aqueles com pouco ou nenhum esforço do consumidor. Antes, no entanto, as empresas ainda precisam resolver alguns gargalos na experiência de compra. “Eliminar a fricção significa mapear a experiência de compra do cliente, e identificar os pontos onde ele possa ter dificuldade e que resultam no abandono da compra. A simplificação dos processos de pagamento pode reduzir essas fricções.”, explica Felipe Vanzelli, CFO da Clickbus.

A inteligência artificial (IA) pode ser a solução para esses gargalos e, mais do que isso, tem potencial para trilhar o futuro das e-wallets. Para Brett King, australiano especialista no futuro do setor bancário e autor de best-sellers como “Bank 4.0: Banking everywhere, never at a bank”, até 2030, todas as carteiras digitais serão baseadas em IA e serão capazes de fornecer aconselhamento financeiro em tempo real. Ainda segundo ele, até 2050, as maiores economias globais serão movidas por IA, iniciando com carteiras digitais e contratos inteligentes. Para King, a capacidade de criar contratos autônomos representa uma das maiores oportunidades para bancos e participantes do setor.

Assista o nosso podcast e saiba mais sobre estratégias de pagamentos no e-commerce:

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