Recentes dados de transações online da ABECS mostram aquilo que muita gente desconfia: na pandemia, o comércio eletrônico virou o “novo normal” em compras.
O levantamento mostra que foram realizados R$ 550 bilhões em transações com cartões de crédito em 2021, um aumento de 42% na comparação com o ano anterior. Esse crescimento foi impulsionado pela pandemia e representou uma inclusão digital nunca vista.
Por outro lado, o aumento exponencial do comércio eletrônico também chamou a atenção de estelionatários. As fraudes cresceram, especialmente o uso de dados de terceiros para a realização de transações online.
“O risco se torna um tema importante porque impacta na operação (da empresa). Nesse sentido, o equilíbrio entre a experiência do usuário e a minimização do risco ganha contornos ainda mais críticos. Discute-se, por exemplo, como chegar ao ‘ponto ótimo’, ou seja, o lugar em que o impacto será o menor possível para todos”, explica Luísa Machado Leite Soares, Chief Legal Officer da Hash e coordenadora do comitê de serviços financeiros da ABO2O.
Cenário
A busca pelo equilíbrio entre os sistemas antifraude nos comércios eletrônicos e a melhor experiência possível para o cliente foi o ponto de partida do encontro promovido pelos comitês de Fintechs e de Customer Experience da ABO2O, com apoio da First Tech e cobertura especial da INOVATIVOS.
No encontro, Luísa citou os dados de uma recente pesquisa da Serasa Experian sobre as percepções de consumidores e empresas em temas como segurança digital, fraudes e assuntos correlacionados.
Segundo o levantamento, 76% das empresas pretendem aumentar os investimentos em soluções para prevenção a fraude este ano. O estudo ainda investigou o tipo de solução que as empresas devem adotar. De acordo com os dados, 23% afirmam que vão adotar soluções em analytics, inteligência artificial, machine learning e automação; outros 18% pretendem fazer mudanças nas aplicações na nuvem.
A pesquisa ainda capturou a percepção do consumidor sobre o tema da segurança digital. Pelos dados, a maior parte dos clientes se mostra preocupado com a segurança (82%).
Experiências e prevenção de fraude: à procura do equilíbrio
O cenário é ainda mais desafiador quando esses temas se chocam com a experiência do cliente. Consumidores são apresentados a verificações e autenticações que nem sempre são bem-vistos e até compreendidos como desnecessários.
Eles normalmente ocorrem no cadastro do cliente ou no processo da primeira compra. Clientes são orientados a responderem perguntas ou a fazerem diversas validações. Alguns, mais impacientes, simplesmente abandonam o “carrinho” do e-commerce por entenderem que tantas barreiras representam uma anomalia no customer experience do site.
“O consumidor precisa entender que a segurança é parte da experiência. Uma boa experiência do cliente é uma experiência segura”, afirma Rodrigo Tavares, SVP de Customer Journey da RecargaPay e Líder do Comitê ABO2O.
Para Edmar Siqueira, Head of Innovation and Payments da FirstTech, essa percepção do consumidor poderá mudar a partir do surgimento de artefatos antifraude mais eficientes. Eles, no entanto, ainda são raros no mercado. “Não sabemos se ele usa o cartão de um amigo ou clonado. Então, existe um grande desafio: como a gente vai mitigar essa fraude na ponta?”.
Tecnologia é importante, porém estratégia é vital
Felizmente, aos poucos, novas ideias e até as primeiras soluções tecnológicas começam a desembarcar nas empresas. Tudo isso tem tornado os processos menos invasivos e até quase invisíveis.
Soluções amparadas em inteligência artificial e machine learning já despontam como os caminhos mais promissores para a automação da etapa antifraude, inclusive com bons resultados.
Um exemplo é o crescente uso de tokens (o armazenamento de informações criptografadas) em substituição ao chamado 3DS, ou uma tecnologia que permite a troca de dados entre o estabelecimento comercial, o emissor do cartão e, quando necessário, o consumidor.
“Não há um custo da tecnologia (3DS) em si, mas existe a questão das pessoas envolvidas no chargeback (estorno do dinheiro). E isso eu também tenho que implementar na empresa. Estima-se que a redução na fraude seja de 26%”, afirma Edmar.
Pedro Monaster, Diretor de Risco da Hash, é a favor dessas soluções, porém afirma que o primeiro passo da companhia é montar uma boa estratégia de prevenção de fraude baseada na compreensão do contexto do cliente. Afinal, as soluções contra fraudes são importantes o tempo todo?
“Toda vez que penso em risco, eu associo com o contexto. Risco é um cálculo do impacto que uma decisão terá sobre o meu negócio. Quando levo o contexto em consideração, eu torno essa conta um pouco mais precisa”, afirma Edmar.
Luiza, da Hash, tem um raciocínio semelhante e acrescenta. “Fica claro que diminuir o número de fraudes e aumentar o número de transação só traz benefício para toda a cadeia. E é isso que a tokenização propõe”, explica.
Um exemplo sobre a importância do contexto está na diferença entre um financiamento imobiliário e um restaurante que faz entregas em casa, segundo Pedro. Pelos valores envolvidos, o atrito na experiência será naturalmente maior no primeiro caso porque há necessidade de um conjunto maior de informações.
“Dentro de uma transação de R$ 10 reais valeria a pena realizar uma análise de risco de R$ 30 ou R$ 40? Talvez não. Se eu gastar R$ 100 para uma transação de 10 mil, talvez valha pena ou não”, explica.
Know your customer
Rodrigo, da Recargapay, explicou que esse tipo de contexto depende de fatores como o tempo, o perfil de cada cliente e até o modelo de negócio.
Juntas, essas informações ajudam a compor uma ideia discutida no encontro e usada por muitas empresas na prevenção do risco: é o chamado Know your Customer, conceito que prevê a adoção de políticas rigorosas com uso de tecnologias para captar e fazer a análise de documentos dos clientes.
“Know your customer ou apenas KYC, para mim, é a primeira fronteira. É onde você detecta uma fraude antes da venda se concretizar ou começar. Em um varejista, o KYC pode ser feito no momento da criação de conta de um cliente. Por exemplo: é possível fazer a verificação de dados, e-mail e até o celular. Em suma, ela cria uma barreira para fraudadores”, afirma Pedro.
Especialistas ainda citaram iniciativas como revisão ou aprimoramento dos processos internos para minimizar as fraudes. Há espaço até para iniciativas mais peculiares, tais como se infiltrar em grupos de discussões sobre fraudes – e que existem aos montes na internet.
Seja qual for o caminho adotado, o fato é que o consumidor precisa entender que processos de segurança podem ser cansativos, porém ele aumenta a possibilidade de a experiência ter mais ou menos o desfecho esperado pelo cliente: produto em casa ou o serviço funcionando.
Processo anti fraude é parte da customer experience: explique a importância das perguntas e pedidos de confirmações na jornada do cliente
Uma velha dica: mapeie todos os processos, inclusive na prevenção contra fraudes
Know your customer: conheça o seu consumidor a partir de uma política rigorosa para análises de documentos dos clientes.
Nem sempre sistemas antifraude valem a pena: avalie se o valor da relação comercial vale o custo da prevenção de risco.
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