Nos últimos anos, um dos maiores desafios do empreendedorismo brasileiro tem sido a inserção de pequenas e médias empresas no contexto da transformação digital — um cenário em que até mesmo grandes corporações ainda não estão plenamente inseridas. Para essas empresas, temas como jornada de experiência do cliente, meios de pagamento eletrônicos e segurança cibernética, muitas vezes, ainda parecem conceitos distantes ou pouco palpáveis, quando não inexistentes. Essa falta de familiaridade com as novas tecnologias reflete a necessidade urgente de adaptação e capacitação para que possam competir em um mercado cada vez mais digital.
De acordo com levantamento feito pelo Sebrae, entre abril e agosto, foram criadas 2,8 milhões de novos CNPJ de pequenas empresas. O setor de Serviços se destaca com quase 61% do total de aberturas de pequenos negócios nos oito primeiros meses de 2024 (1,7 milhão). Na sequência, vêm o Comércio (25,6%), a Indústria (7,9%), a Construção (7 %) e a Agropecuária (0,7%).
Para entender melhor esse cenário, a Inovativos conversou com Ivan Tonet, gerente adjunto de mercados do Sebrae, entidade que tem se empenhado em auxiliar as PMEs na digitalização dos seus negócios. Tonet falou de iniciativas como o programa Agente Local de Inovação (ALI) e o Move Mais. Nesta entrevista, Tonet também refletiu sobre o impacto das tecnologias emergentes, como inteligência artificial e big data, e o papel do Sebrae em preparar pequenos negócios para essas inovações, transformando desafios em oportunidades. Acompanhe:
Inovativos – No SEBRAE, a questão do acesso à tecnologia é uma preocupação constante. Como vocês têm lidado com esse desafio, especialmente no contexto de pequenas e médias empresas que enfrentam dificuldades para se digitalizar?
Ivan Tonet – A pandemia acelerou o mercado digital e evidenciou a necessidade de digitalização dos negócios. O Sebrae reconhece que muitos empreendedores precisam de apoio nesse processo. Para responder a essa demanda, o Sebrae desenvolve várias ações para promover a digitalização dos pequenos negócios, que vão desde o uso de ferramentas digitais de gestão até a digitalização de processos produtivos. O Move Mais é um exemplo que oferece ferramentas práticas, como o Mapa de Marketplaces e a Calculadora de Marketplace, ajudando os empreendedores a entender melhor as oportunidades do mercado digital.
Inovativos – Durante o Innovation Xperience Conference, vocês destacaram a importância da educação no processo de expansão da inovação no mundo corporativo. Como a oferta de cursos direcionados ou a educação técnica tem contribuído para a transformação digital de micro e pequenas empresas? Poderia nos dar exemplos?
Ivan Tonet – O empreendedor de uma micro ou pequena empresa, na grande maioria das vezes, é a sustentação da operação da sua empresa, tendo que assumir diversas funções. Com isso, sobra pouco tempo para pensar em inovar e aprimorar seus processos. Sua mente fica absorvida nos problemas do dia a dia. Muitas vezes, o que o empresário precisa é de alguém que o questione e o incentive a refletir sobre o futuro de sua empresa e as possibilidades de aprimoramento. É nesse sentido que cursos e consultorias o incentivam a pensar diferente e buscar inovações, as quais estão intimamente relacionadas à transformação digital.
Inovativos – Ainda no iX Conference, vocês citaram a importância do programa Agente Local de Inovação. Poderia falar um pouco mais sobre ele? Vocês já possuem dados que demonstrem o impacto dessa iniciativa nas comunidades atendidas?
Ivan Tonet – O programa Agente Local de Inovação (ALI) existe há 16 anos no Sebrae. Nesse período, o programa incentivou a inovação em milhares de empresas, com melhorias de processos, inovação de produtos e outros. Em agosto de 2022, o Sebrae lançou uma nova modalidade do ALI chamada ALI Transformação Digital. Nesta modalidade, o Agente Local de Inovação apoia a empresa a aumentar seu nível de digitalização por meio da adoção de ferramentas plug-and-play, de baixo custo e rápida implementação, para solucionar problemas previamente diagnosticados. Em dois anos de ALI Transformação Digital, 18 mil empresas foram atendidas e investiram juntas cerca de R$ 22 milhões em ferramentas digitais. No início do atendimento com o ALI, 85% das empresas apresentavam maturidade digital classificada como inicial ou novata, e apenas 15% foram classificadas com maturidade digital competente ou avançada. Ao final, observamos um aumento de 9 pontos percentuais na quantidade de empresas com maturidade digital competente ou avançada, com 24% das empresas classificadas nesse nível. O programa também mostrou a diversidade de necessidades para a digitalização das empresas, já que, dentre as 13 mil empresas que adquiriram uma ferramenta digital no âmbito do programa, observou-se mais de 3 mil ferramentas diferentes contratadas.
Além do ALI Transformação Digital, o programa tem como sua maior modalidade o ALI Produtividade, onde, por seis meses, as empresas recebem acompanhamento e orientação para inovarem a fim de se tornarem mais produtivas, faturarem mais e gastarem menos. Essa modalidade, que foi lançada em novembro de 2020, em plena pandemia, já atendeu até hoje 195 mil empresas, que tiveram um aumento médio de 22% em sua produtividade e 8% de aumento real de faturamento (descontando a inflação).
Inovativos – Você poderia compartilhar um ou mais exemplos concretos de transformação local promovida por essa iniciativa? Como as comunidades ou empresas foram impactadas?
Ivan Tonet – Com o atendimento a mais de 200 mil empresas, são centenas de casos de sucesso do programa ALI. Um exemplo é o da Talita Moura, fisioterapeuta, proprietária da Clínica Fisiovida, localizada em Rio Verde, Goiás. Antes de entrar no ALI, sua clínica, que tinha o foco em aulas de pilates, possuía 54 alunos, com 4 fisioterapeutas e 1 ponto de atendimento. Com o trabalho junto ao ALI, a empresária aprimorou sua gestão, implantou ferramentas digitais e inovou. Um ano depois, a clínica passou a contar com 4 pontos de atendimento, 11 fisioterapeutas e 130 alunos. Talita também diversificou seu modelo de negócio e passou de ser uma clínica apenas de pilates para contemplar 8 diferentes negócios, incluindo fisioterapia de reabilitação, psiquiatria, cursos, venda de produtos, entre outros. Com todas essas mudanças, Talita viu o faturamento de sua empresa triplicar.
Inovativos – Quais são os principais desafios enfrentados por pequenos e médios empreendedores no contexto da digitalização de negócios? Como o SEBRAE está auxiliando esses empresários a superarem essas barreiras?
Ivan Tonet – Diagnósticos feitos com micro e pequenas empresas (MPEs) atendidas pelo Sebrae revelaram que 85% dessas empresas estão em estágio inicial de maturidade digital. As áreas com maiores desafios incluem estratégia, uso de dados e capacitação de pessoas. O Sebrae atua para superar essas barreiras por meio de iniciativas como o Programa Move Mais, que oferece ferramentas e diagnósticos personalizados, capacitando os empresários para superar essas dificuldades e avançar em sua jornada de transformação digital. Basta acessar www.sebrae.com.br/movemais.
Inovativos – Como o SEBRAE enxerga o papel das tecnologias emergentes, como inteligência artificial e big data, na transformação digital de pequenas e médias empresas? Quais são as oportunidades e os desafios que essas tecnologias apresentam para os empreendedores?
Ivan Tonet – O Sebrae entende que tecnologias emergentes, como inteligência artificial (IA) e big data, trazem grandes oportunidades para as micro e pequenas empresas. Essas ferramentas podem otimizar a tomada de decisões, personalizar o atendimento ao cliente e aumentar a eficiência dos processos. Entretanto, essas tecnologias apresentam desafios, como uma mudança no modelo mental do empreendedor, bem como a necessidade de capacitação para seu uso.
Inovativos – De que forma o SEBRAE está ajudando pequenos e médios empreendedores a se adaptarem às mudanças rápidas no comportamento do consumidor digital? Há iniciativas específicas voltadas para a capacitação em e-commerce e marketing digital?
Ivan Tonet – O Sebrae oferece consultorias e mentorias, como o Up Digital Marketing, que guia os pequenos negócios desde a compreensão do comportamento do cliente até o melhor uso dos canais digitais. As parcerias com grandes players como Correios, Meta, TikTok, Amazon, Mercado Livre, Shopee, entre outros, proporcionam soluções que auxiliam os empreendedores na construção de estratégias eficientes no ambiente digital e ações para ajudar os pequenos negócios. Além disso, o Sebrae apoia a participação de empresas em eventos de grande porte, seja como expositoras ou visitantes, facilitando a entrada e o crescimento dos pequenos negócios no e-commerce.
Inovativos – Com o crescimento das fintechs e soluções de pagamento digital, como o SEBRAE tem orientado as pequenas e médias empresas a adotarem essas ferramentas para otimizar seus processos financeiros e melhorar a experiência do cliente?
Ivan Tonet – O Sebrae lançou o Up Digital Gestão Financeira, uma solução que visa transformar a maneira como os pequenos negócios utilizam o digital para a organização de suas finanças. Com mentorias individuais e encontros coletivos, a iniciativa ensina os empreendedores a adotar soluções digitais e fintechs, otimizando seus processos financeiros e proporcionando uma experiência mais ágil para seus clientes.
