Inovação Digital e Tecnologia na Centralidade do Cliente

“Tecnologia sem gente é morta”, afirma o investidor e consultor Gueitiro Matsuo Genso

Quem acompanha o noticiário de inovação e startups se deparou com uma série de reportagens sobre demissões em massa em empresas unicórnios, institutos de pesquisas apontando redução de investimentos e um mercado, aparentemente, menos aquecido que nos últimos anos. De fato, houve uma desaceleração, mas nada que não faça parte da conjuntura atual. E mais: isso não é um “problema” exclusivamente brasileiro. “Os VCs estão sendo mais cautelosos e levando mais tempo para analisar os investimentos. Não vejo falta de recursos para projetos com Product Solution Fit ou para escalar negócios”, ressalta Gueitiro Matsuo Genso, especialista em serviços financeiros e pagamentos, advisory e ex-CEO do PicPay. 

Com vasta experiência no mercado, o executivo, que já foi presidente da Previ e Vice-Presidente do Banco do Brasil, atualmente é do Comitê de Inovação da TUPY, Conselheiro Independente da Liderança Capitalização, membro do FEA Angels, investidor em startups, Co-founder da GBG Senior Tech Ventures e Mubius Women Tech Ventures, Mentor e consultor. Em entrevista à INOVATIVOS, Gueitiro, que se dedica a estudar os impactos e as oportunidades que a tecnologia está promovendo nos modelos de negócios das empresas e em nossa sociedade, falou sobre o atual cenário de startups e investimentos no Brasil.

INOVATIVOS – De maneira geral, como você avalia o atual cenário de startups no Brasil?

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Gueitiro – Avalio o ambiente geral como positivo. O ecossistema brasileiro já é reconhecido no mundo como um lugar a ser observado de perto pelos investidores globais. Temos um mercado grande, empreendedores criativos, marcos regulatórios sendo aperfeiçoados e pessoas/empresas abertas a novas tecnologias.

INOVATIVOS – E o de investimentos?

Gueitiro – Na questão investimentos, estamos passando por um momento conjuntural, mas não é somente o Brasil. Estamos falando de reflexo da elevação das taxas de juros dos EUA e, com isso, os valuations ficaram menos esticados, passando a sensação que escassearam os recursos. Eles não diminuíram. Continua existindo funding para bons projetos, óbvio que, agora, numa condição diferente.


INOVATIVOS – Alguns estudos indicam que os investimentos em startups vinham crescendo no país até 2021, e agora enfrenta uma queda. O quanto essa percepção é real?

Gueitiro – Os fundos para investimentos continuam existindo. Essa percepção de redução pode ser que, na conjuntura atual, os VCs estejam sendo mais cautelosos e levando mais tempo para analisar os investimentos. Não vejo falta de recursos para projetos com Product Solution Fit ou para escalar negócios.

INOVATIVOS – Vimos muitas notícias sobre grandes startups demitindo em massa, mesmo após terem conseguido milhões em investimentos anteriormente. Qual a sua análise a respeito?

Gueitiro – Óbvio que cada caso é um caso, mas, de forma geral, a minha visão é que isso é uma combinação de um efeito que acontece com todo mercado em crescimento exponencial. Abundância de funding por conta de taxas de juros baixas leva o capital a buscar riscos, e isso traz um efeito “correria” para aplicar em projetos. Essa “correria” dos investidores facilitou a captação de startups que não se sustentavam sem capital de risco por longo tempo (e algumas, talvez, nunca geraria dinheiro de cliente). A “água” baixou e muito barco ficou encalhado. Talvez se a água não tivesse baixado, assistiria o barco dessas startups encalhar mais à frente.

INOVATIVOS – O atual cenário político/econômico incentiva mais investimentos em organizações mais bem estabelecidas (private equity) do que em empresas emergentes (venture capital)? Quais as suas observações sobre isso?

Gueitiro – Não vejo concorrência de recursos entre esses dois mercados, até porque a dinâmica é bem diferente. Quem tem perfil de risco para VCs está buscando múltiplos maiores para viabilizar a carteira e, para isso, a arte é encontrar o projeto de maior probabilidade o mais cedo possível (custa menos). No caso de private equity, o desafio é acelerar uma empresa que já tem escala, aportando gestão e capital. Portanto, cada um está num momento do ciclo da empresa.

INOVATIVOS – Existe algum tipo de conflito de gerações entre novos empreendedores e investidores mais experientes, que pode estar direcionando os investimentos para empresas mais maduras e não tão disruptivas?

Gueitiro – Não vejo esse conflito. A questão é que os recursos podem estar sendo direcionados para startups com Product Solution Fit no mínimo e o investidor olhando como será monetizado algum dia. Investimentos ditos em “powerpoint” serão mais raros, ficando a cargo de anjos e dos próprios founders.

INOVATIVOS – Você acredita que deve haver alguma pausa no “boom” das startups no futuro próximo? Se sim, quais razões podem a levar isso? Se não, o que os novos empreendedores precisam fazer de diferente para evitar isso?

Gueitiro – Não gosto de “boom”. Todo crescimento descontrolado tem efeitos colaterais. Acho que estamos passando por um “freio de arrumação”, o que é muito bom. O ecossistema brasileiro estará muito mais forte nos próximos anos, atraindo capital. Agora, para buscar esse capital será cada vez mais necessário provar que, de fato, a solução resolve o problema do cliente e que ele pagará por isso.

INOVATIVOS – De que forma o comportamento/características das novas gerações de empreendedores pode estar impactando o sucesso das startups?

Gueitiro – O lado bom que é nova geração já nasceu com a velocidade exponencial da tecnologia, portanto já nascem como “empreendedor tecnológico”. Por outro lado, como temos cada vez mais jovens empreendedores (o que é bom), eles nem sempre tem experiência para cuidar de gente. E tecnologia sem gente é morta. Quando a startup começa a crescer, é preciso ter habilidade para cuidar de gente.


INOVATIVOS – Considerando as atuais demandas da sociedade, quais segmentos tendem a ter melhores chances para captar recursos e se consolidar?

Gueitiro – As que resolvem problemas reais do cliente e tem mercado grande o suficiente e as que estão buscando se posicionar em tecnologias disruptivas, tais como web.30, based plant, Health, dados.

INOVATIVOS – Como você vislumbra o cenário de startups e o mercado de investimentos no Brasil a curto e médio prazo?

Gueitiro – Estou bastante otimista, o “inverno” fortalecerá o nosso ecossistema e o Brasil tem tudo para se consolidar com destaque em inovação no mundo.

Se olharmos que o 5G tem um cronograma de implantação nos próximos anos e viabiliza a internet das coisas e, consequentemente, a economia de dados, podemos afirmar que, em cima dessas plataformas, muitos negócios que ainda nem temos ideia serão criados. No mercado financeiro, o Banco Central é a maior plataforma de inovação dos últimos anos, os marcos regulatórios e a infra que eles entregaram ao mercado tem produzido enormes ganhos ao ecossistema e à inovação.

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