Quando observamos, ouvimos, sentimos, interagimos ou, enfim, somos envolvidos por uma obra de Arte, muitas vezes não percebemos como aquela produção nos alcançou, quais os caminhos, desafios, dificuldades e limitações o artista teve de resolver para nos trazer sua expressão, comunicando suas várias mensagens, provocando-nos. Várias são as pressões que incidem sobre o desenvolvimento da Arte ao longo dos séculos.
Restrições políticas, ideológicas, financeiras, sociais e de recursos se aliam aos interesses dos próprios artistas, valorizando adicionalmente o que foi produzido, o que nos alcança através dos nossos sentidos e emoções. É interessante fazer uma observação para alguns fatos e evidências deste complexo caminho da produção artística, compreendendo o papel dos apoiadores e das situações potencialmente favoráveis que possibilitaram, em momentos específicos, uma produção notável.
Uma questão que sempre se coloca quando avaliamos este contexto é analisar se houve impactos para a concepção e geração de uma obra quando ocorreu o apoio financeiro, político, ideológico ou associativo a uma obra de arte.
Não raro, em nossas intervenções com alunos, clientes e contatos em geral, quando afirma-se o patrocínio e/ou apoio a uma obra, surgem questionamentos de direcionamento, independência, direcionamento da criatividade, oportunidade, sobrevivência de um artista ou de um movimento, entre vários outros. São questões importantes, que nos levam a trazer as reflexões para o mundo de negócios, especialmente na atualidade onde há incentivos, mecanismos e disseminação da cultura de investimentos – por exemplo via fundos e investimentos “anjo” – para que negócios e soluções inovadoras decolem, ganhem força e escalem. Vamos analisar alguns exemplos e trazer reflexões para a nossa análise com relação aos incentivos, apoios e contratações.
O professor, maestro e percussionista Werner Silveira nos sinaliza, em um de seus textos, por exemplo, o apoio do Arquiduque Rudolph, membro da casa real dos Habsburgos, à Ludwig van Beethoven. Diretamente, ou influenciando mecenas de seus relacionamentos, como o príncipe Joseph Lobkowitz, este membro da realeza centro-europeia motivou o financiamento decisivo para que o genial compositor prussiano produzisse peças que até hoje nos provocam a admiração, como as sinfonias (da terceira à sexta, ao menos), concertos e obras para quartetos de cordas. Como resultado, o compositor teve provimento de estrutura suficiente e condições para desenvolver seus estudos, ensaios e produções, contando com instalações, músicos de orquestra e apoio logístico. Nossa admiração agradece, o mundo nunca mais foi o mesmo depois da carreira de Beethoven! Ainda segundo o influente pesquisador brasileiro, outro caso relevante é o da empresária russa Nadejda Von Mekk em seu peculiar – estranho, distante, isolado, idílico – apoio principalmente a Piotr Tchaicovsky e a Claude Debussy.
No caso da pintura, vemos o relacionamento de galerias de arte, promotores e curadores de exposições e montagens, patronos de escolas e de artistas em particular, o reticulado comercial e mercadológico de apoio com leiloeiros, comerciantes e marchands que, ao final, direcionam as obras a um mercado que avalia a arte por valores tão variados como simples propriedade em coleções particulares, envaidecimento pessoal, relacionamento familiar ou, finalmente, investimento financeiro. O complexo caminho pode ser exemplificado por dois casos conhecidos: O primeiro da inclusão, por várias vezes via doação, de coleções particulares a museus. Por exemplo, a cessão feita pela família do empresário Roger
Wright, à Pinacoteca de São Paulo, em comodato por dez anos a partir de 2016, caracteriza-se como um caso mesmo que temporário. Grandes museus e galerias de arte mundiais se beneficiam de cessões desta forma, tornando-se guardiões das obras de posse anterior de uma pessoa ou família. O segundo são os cinematográficos arremates com altos valores de obras de arte em leilões realizado por célebres casas, como o que aconteceu em maio de 2022, pela casa Sotheby´s da coleção de arte moderna (Andy Warhol, Picasso, Rothko, De Kooning, entre outros) do casal Macklowe, do setor imobiliário norte-americano, que alcançou o valor de 922 milhões de dólares.
As conotações da valorização da arte, em suas várias expressões, impressionam, determinando um contexto fundamental para nossas reflexões, ainda mais quando apreciamos os bruscos movimentos de liquidez monetária e a dinâmica de regras fiscais, de câmbio e investimentos atuais. Trazendo o momento de reflexão, a partir das inúmeras avaliações da Arte ao longo de vários anos, alguns pontos emergem, considerando o mecenato, investimento e apoio aos projetos inovadores.
Há condições de inovar independentemente após o investimento? O inovador (um artista do empreendedorismo) se sente apoiado ou restrito pelo investimento? Há interferências de ordens inesperadas – culturais, sociais, políticas, ideológicas, entre outras – para o apoio financeiro? Qual o retorno perceptível aos investidores?
Uma família real que apoiava um compositor ou escultor, um movimento étnico que adota um músico e suas composições, uma onda vanguardista ou conservadora que auxilia e divulga a obra de um autor, nos mostram sinais para pensar a respeito dos complexos e detalhados contratos de investimentos.
Outras questões sucedem, que podem ter o histórico da Arte como base para decisões: Por quanto tempo haverá este investimento ou apoio? Quais as condições em que ele ocorre e poderá ser mantido? Quais as comunicações teremos de fornecer ao apoiador ou investidor, para que ele se sinta no controle de seu apoio? Podemos dizer que este apoio é exclusivo para nossa forma de arte (modelagem de negócios) neste setor e no mercado? Afinal, o que realmente motivou o investimento ou apoio? Retorno financeiro? De imagem? De reputação?
No exame histórico do que aconteceu e acontece com o mecenato na Arte, várias ocorrências traduzem experiências importantes para nosso conhecimento. Desde a contratação de um grande compositor, como Joseph Haydn, pela família Esterházy, da nobreza austro-húngara, da experiência de vários pintores apoiados pela Igreja Católica (ou contratados por ela, para algumas de suas obras de excelência, residentes em catedrais e museus), passando pelo abandono, críticas e cessão inesperada dos recursos por parte de apoiadores descontentes ou em descontrole de seus investimentos, várias histórias que podem preparar o empreendedor para os momentos de sustento e apreensão com base nos recursos financeiros e de apoio.
O empreendedorismo moderno se apoia na dinâmica dos mercados, necessita do efetivo investimento por interessados e estrategistas de setores, governos, associações e empresas. Porém métodos e caminhos precisam ser constantemente examinados, avaliados, decisões devem ser tomadas com fundamento. Pense se um dos prestigiados artistas tivesse enfrentado obstáculos severos para a continuidade de sua produção ou revelasse, ao final de sua vida, que “queria ter feito outra coisa” com sua criatividade e capacidade inovadora. São caminhos que podem reger a estratégia do mecenato, pensando em paralelo da Arte e da Gestão empreendedora.