Por Carol Marino
Imagine tirar os óculos de realidade aumentada da mochila, estando em qualquer lugar do mundo, colocá-los no rosto e chegar ao trabalho para participar de uma reunião com a equipe. Ou interagir e assistir a um espetáculo com um amigo que mora em um país distante, como se estivessem sentados lado a lado. Nesse ambiente imersivo e digital, você pode entrar por holografia, que permite a projeção mais precisa de sua aparência, ou como um avatar, em uma versão mais tecnológica. A decisão é sua e pode ser feita a partir do seu humor do dia. Nesse mesmo mundo, é possível que empresas gerem negócios e experiências cada vez mais reais e da forma que melhor atenda às suas necessidades. Bem-vindo às possibilidades que o metaverso pode proporcionar. A perspectiva é que a tecnologia seja usada de maneira mais ampla – torne esses cenários possíveis – em torno de dez anos, à medida que o 5G avança e as empresas investem na área.
Uma das pioneiras na busca por essa realidade é a Meta. Em 2021, Mark Zuckerberg, fundador da gigante de tecnologia, anunciou o fundo de investimento XR Programs and Research Fund, que conta com US$ 50 milhões em pesquisas e programas para o desenvolvimento do metaverso. Tudo isso num trabalho colaborativo que envolve parcerias com outras indústrias, pesquisadores, governos e organizações da sociedade civil.
Em maio de 2022, por exemplo, a empresa fechou parceria com quatro organizações brasileiras – ITS Rio (Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio), IRIS (Institute for Research on Internet and Society), Safernet e IP.Rec. “O objetivo é fomentar projetos e pesquisas externas que nos ajudem a construir o metaverso de maneira responsável, com bem-estar e segurança”, explica Cristina Farjallat, diretora de negócios Latam da Meta. Trata-se de uma construção conjunta, similar ao processo que levou à criação da internet. E, como em toda novidade, ainda há muitos passos a serem dados para sabermos, realmente, onde essa tecnologia pode nos levar.
Visto como o próximo capítulo da internet, o metaverso está apenas no começo ou, como diz Cristina, no estágio de “internet discada” de seu desenvolvimento, para fazer um paralelo com o surgimento das redes de conexão. Isso quer dizer que não teremos acesso imediato a tudo que engloba esse conceito, da mesma forma que não tivemos na década de 1990 com o início da internet. “O que já sabemos é que as interações virtuais no metaverso serão mais parecidas com as que temos em nossas vidas diárias. A internet móvel já permitiu que as pessoas trabalhassem, aprendessem e socializassem de formas mais amplas e menos limitadas pela localização física. O metaverso vai levar isso ainda mais longe”, afirma a executiva. Se tudo caminhar como o previsto e progredir da mesma maneira que a tecnologia móvel, a consultoria econômica Analysis Group projeta que, na América Latina, o metaverso pode contribuir com uma participação de 5% do Produto Interno Bruto (PIB), ou US$ 320 bilhões, em 2023.
O caminho já traçado
Os primeiros passos para o mundo do metaverso já foram dados. As tecnologias consideradas como porta de entrada para a tecnologia, como a Realidade Aumentada (RA), fazem parte do dia a dia de muitas pessoas. Atualmente, mais de 700 milhões de usuários no mundo utilizam efeitos de RA todos os meses no Facebook e Instagram, negócios do Grupo Meta. O Brasil está entre os 10 principais países de criadores ativos do Spark AR para o Instagram, ferramenta que permite desenvolver filtros interativos ou efeitos de RA.
“O que já sabemos é que as interações virtuais no metaverso serão mais parecidas com as que temos em nossas vidas diárias. A internet móvel já permitiu que as pessoas trabalhassem, aprendessem e socializassem de formas mais amplas e menos limitadas pela localização física. O metaverso vai levar isso ainda mais longe”
Cristina Farjallat, diretora de negócios Latam da Meta
Além das parcerias para o XR Programs and Research Fund, a área de Reality Labs Research da Meta vem trabalhando no desenvolvimento de tecnologias que possam reproduzir as sensações do mundo físico e facilitar a interação com o ambiente virtual, como explica Cristina. De acordo com ela, isso engloba, capacidade computacional e gráfica dos óculos, e pesquisas constantes. “Em novembro de 2021, apresentamos um protótipo de pesquisa de luva tátil que permitirá tocar e sentir objetos virtuais e, em março deste ano, um projeto de pulseira que capta sinais elétricos do punho para possibilitar a interação com elementos virtuais”, conta.
Só em 2021, a Meta investiu cerca de US$ 10 bilhões em pesquisas e desenvolvimento de hardware de Realidade Virtual, assim como software e conteúdo. E, desde 2016, US$ 16 bilhões em segurança das plataformas. A companhia está, ainda, aproveitando sua infraestrutura, investimentos e experiências existentes, como os 40 mil profissionais que trabalham com questões ligadas à segurança, incluindo 15 mil focados em revisão de conteúdo. A executiva explica que muitas das demandas e desafios vão aparecer ao longo dessa construção, bem como a exigência de padrões abertos e de interoperabilidade que permitam às pessoas navegar entre as diferentes experiências de forma simples e sem atritos. Isso, claro, com a privacidade e a segurança no centro.
Potencial de negócios
O avanço do metaverso abre uma série de possibilidades para as empresas no que diz respeito à interação com os clientes, cujo comportamento é cada vez mais omnicanal, ou seja, aquele no qual as pessoas pulam de um aplicativo para um site, enquanto conversam pelo WhatsApp e fazem buscas em lojas e empresas. E, mais importante: elas esperam que a experiência seja a mesma em todos os canais, como ressalta Cristina. Por isso, a executiva recomenda dar maior atenção a essa experiência de forma holística, com o consumidor no centro de todas as decisões e estratégias. “Pouco adianta estar imerso em técnicas, números e novas tecnologias se não nos mantivermos atentos e conectados com a cultura, desejos, tendências e comportamentos de quem gostaríamos de chamar para uma conversa”, explica.
Isso quer dizer que, antes de implementar qualquer novidade, é preciso primeiro entender o comportamento de seu público para, assim, construir ou escolher tecnologias que respondam a essas demandas. Isso porque, de acordo com Cristina, as tecnologias mudam, mas as necessidades humanas, como comunidade, conexão, entretenimento e autoexpressão seguem as mesmas. “Cada usuário que se conecta às nossas plataformas diariamente, seja Facebook, Instagram ou WhatsApp, está de alguma forma buscando conexão. E é nesse ambiente que as marcas estão inseridas, em meio a conexões humanas. Com isso em mente, há muitas possibilidades de instrumentação técnica – desde o entendimento da mensuração e leitura de dados até a imersão em inovações com Realidades Aumentada e Virtual e, no futuro, o metaverso de forma mais ampla”, explica Cristina.
Segundo ela, a Realidade Aumentada, uma das tecnologias que possibilita a entrada no metaverso, já está acessível por meio dos dispositivos móveis e aplicativos em 2D que utilizamos atualmente, e vem sendo usada por uma série de marcas. Entre as companhias estão a Fiat, que fez o lançamento do Fiat Pulse com um filtro RA que permite aos clientes “visualizar” o carro em sua garagem, e a Consul, que uniu a experiência de um filtro de RA conectado a uma conversa no WhatsApp. No Instagram da marca, o consumidor seleciona o item de interesse: “Refrigeradores”, “Lava-roupas” ou “Fogões e Cooktop” e aponta para o local da casa em que gostaria de visualizá-lo.
Claro que cada empresa tem seu tempo de adaptação e perfil, e a perspectiva é que ainda leve alguns anos para que o metaverso se torne 100% realidade e esteja presente em mais companhias. Mas uma coisa é certa: os negócios que embarcarem nessa jornada antes sairão em vantagem. Nesse sentido, Cristina recomenda uma pergunta central: o que é possível fazer hoje para se preparar para esse futuro?
O primeiro passo, conta, é se concentrar em utilizar o máximo potencial do marketing mobile desde já, aplicando as melhores estratégias e ferramentas de storytelling, como diferentes formatos de vídeo, fazendo parcerias com criadores de conteúdo e melhorando a interação com clientes – o que pode ser feito por meio de recursos como mensageria, serviço utilizado para intermediar a troca de mensagens entre sistemas para realizar a integração de serviços. “Os aplicativos de mensageria, amplamente adotados pelas marcas no início da pandemia, diminuem distâncias e derrubam barreiras geográficas para a construção de comunidade, e ajudam os negócios a oferecerem uma experiência de compra mais humanizada e próxima daquilo que se tem nas lojas”, exemplifica Cristina. Ela destaca que a popularização das ferramentas de criação de conteúdo aumenta a oferta de entretenimento e abre espaço para as pessoas se expressarem. “Muitas empresas estão se dando conta do poder de se unir a esses criadores para desenvolver parcerias na busca por uma comunicação mais autêntica e para ampliar sua audiência”, diz.
Nem tão complicado assim
A ideia básica do metaverso não é complexa, como muitos imaginam. “Trata-se da próxima evolução em uma longa jornada de tecnologias sociais que funcionará como uma combinação híbrida das experiências sociais online atuais”, afirma Cristina. De maneira prática, são espaços digitais que permitem que você faça coisas que não poderia fazer no mundo físico, ao lado de pessoas que não estão no mesmo espaço que você, tornando as experiências online mais imersivas e mais significativas. Porém, Cristina reforça que nada substitui estar junto fisicamente. “A chegada do metaverso não quer dizer que vamos passar mais tempo online do que ao vivo com as pessoas. Mas quando não pudermos estar pessoalmente, o metaverso vai permitir experiências virtuais e significativas”, diz. Isso porque, por proporcionar imersão e engajamento, fica mais fácil sentir que estamos de fato tendo uma experiência compartilhada, mesmo quando não podemos estar juntos, como num jogo em família ou assistindo a um espetáculo executado à distância, ao lado de um amigo que mora em um país distante.
Aposta na capacitação – e na inclusão
As iniciativas da Meta para forma um ecossistema de aprendizagem em metaverso
Com o amplo leque de possibilidades do metaverso, investir na capacitação de profissionais é essencial para que a tecnologia avance. Nesse sentido, a empresa de Zuckerberg está investindo globalmente R$ 150 milhões ao longo de três anos para ajudar a desenvolver a próxima geração de criadores do metaverso. “Investir nessa área significa viabilizar experiências imersivas de alta qualidade que podem transformar a forma como aprendemos e, no futuro, aumentar o acesso à educação por meio de tecnologias a comunidades que, de outra forma, provavelmente não teriam acesso em um primeiro momento”, explica Cristina. Recentemente, em parceria com a Amazon Web Services, a empresa anunciou um programa que pretende capacitar 50 mil brasileiros em nuvem, marketing digital e tecnologias relacionadas ao metaverso, como Realidade Aumentada. A ação terá como foco pessoas com idade a partir de 18 anos e formadas em escolas públicas e priorizará a capacitação de mulheres, pessoas negras e da comunidade LGBTQIA+.
Outra iniciativa é o Desafio RAP: Realidade Aumentada na Pele, um programa exclusivo para o Brasil que surgiu para aumentar a diversidade entre os criadores de filtros de RA. “Os vencedores foram anunciados recentemente e estamos oferecendo treinamentos e uma premiação voltados exclusivamente para a comunidade negra, a fim de trazer mais representatividade ao ecossistema e, com isso, ajudar a mitigar a grande lacuna de inclusão que ainda existe no ambiente digital”, conta a executiva.
Além disso, a Meta firmou parcerias com organizações como a Platzi, uma das principais plataformas de educação online da América Latina, e a Organização dos Estados Americanos (OEA) para treinar criadores em codificação, bem como em tecnologia Spark AR da companhia. No total, mais de 13 mil vagas de treinamento para aprendizado imersivo de RA foram entregues na região nos últimos seis meses.