Em abril deste ano, o PIX alcançou uma marca histórica, mesmo com pouco tempo de vida. Lançada em novembro, a modalidade de pagamento instantâneo precisou de apenas cinco meses para chegar a 51% de todas as transações bancárias no Brasil realizadas no mês de abril. Todas as outras formas de pagamento, caso do TED, DOC, boleto bancário e cheque, chegaram a 49%.
De fato, o ritmo de incorporação da inovação na sociedade foi alucinante e já coloca várias pulgas nas orelhas dos representantes do sistema financeiro: afinal, o que vai acontecer com os cartões de crédito e débito, além de outras formas de transações mais tradicionais, que estão se distanciando da vida do consumidor?
Mundo em transformação e o PIX
Segundo Vitor Magnani, presidente da ABO2O e do CEDI da FecomercioSP, o avanço avassalador do PIX começa a com a mudança no comportamento do consumidor, que adotou uma rotina que ele define como life as a service.
“Estamos passando por um contexto que poderíamos chamar de life as a service ou vida como serviço. No momento que eu tenho a possibilidade de pedir carro pelo celular, eu me sirvo de algo que um dia foi um produto. Estamos passando por uma transformação agregando cada vez mais serviços digitais”.
Esse movimento de life as a service está impactando a todos as indústrias, inclusive o setor financeiro. Em novembro do ano passado, PIX era implementado e, hoje, um ano depois, o debate é sobre o incremento de novos serviços.
Há um lado do PIX que chama a atenção dos bancos: ele tem o potencial para extinguir quase todas as modalidades existentes hoje. Segundo Daniel Moretto, CSO e Executive Director da CSU, o PIX está “atacando” o cartão de débito e, em breve, vai ocupar o espaço de queridinho do consumidor.
Além disso, ainda segundo Moretto, o PIX ainda deverá uma face ainda mais impactante: o PIX parcelado ou garantido, cuja ideia é antecipar o valor de pagamento para o seu credor, mas que seria debitado do cliente apenas no fim do mês – tal qual o seu próximo alvo: o cartão de crédito.
“Nós já estamos criando produtos para o Pix parcelado. Do mesmo jeito que a gente processa fatura de cartão de crédito ou pré-pago, teremos produtos que vão na linha do PIX”.
Segundo Fabio Lins, superintendente executivo de Canais, Pix, I.A. e open Finance Banco Original, o PIX já teria feito as suas duas primeiras vítimas: ele já teria aposentado o TED e DOC.
“Ele está acabando com os meios de transferência tradicionais, caso do TED e DOC. As pessoas já nem falam mais dessas formas de transferências de dinheiro. Mais do que isso, vemos uma forte canibalização do boleto e cartão de débito. Quanto ao Pix garantido, eu, sinceramente, eu não sei o que vai acontecer com o cartão de crédito. Tudo isso vai mudar o modus operandi de fazer transações”, afirma Lins.
Outro lado transformador do PIX está ocorrendo nas empresas. Segundo André Tonelini, diretor de clientes e negócios Banco Carrefour, o PIX encerrou pontos de fricção nos meios de pagamento, principalmente por colocar um ponto final no recebimento de valores somente após quase dois meses.
“Um dos pontos de atrito ou de fricção é o pagamento. Quando surgiu o PIX, isso facilitou muito o varejo nesse processo. Agora, você tem um pagamento 24×7 ou em tempo real. Por conta disso, o estabelecimento recebe na hora”.
Open Banking
Outra novidade que se avizinha no horizonte do consumidor e que está em fase final de debates é o Open Banking.
Segundo o Banco Central do Brasil, o Open Banking, ou sistema financeiro aberto, permitirá que os clientes de produtos e serviços financeiros possam compartilhar as informações para diferentes instituições autorizadas pelo Banco Central. Além disso, a movimentação das contas bancárias poderá ocorrer em diferentes plataformas e não apenas pelo aplicativo ou site de um único banco.
Segundo Moretto, o termo open banking, inclusive, já foi superado por uma expressão mais abrangente. Agora, vivemos às vésperas do open finance, ou seja, a oferta de todo o acervo presente no sistema financeiro a partir desse sistema aberto: seguros, investimentos, empréstimos, entre outros.
Marcelo Scarpa, diretor executivo da Digio, comparou o open finance a um supermercado.
“Você não vai ao supermercado de uma única marca. Nele existem várias marcas. O open banking permite que o cliente se sirva dos produtos que ele realmente deseja. Ele pode pegar o seguro de um banco, investimentos de outro. O consumidor vai formar o seu próprio banco”, afirma.
Os próximos passos
Diante de um cenário com tantas novidades, projetar o futuro do sistema financeiro não é algo tão difícil. Ou seria?
Uma das primeiras novidades não necessariamente vai ocorrer na parte financeira em si, mas na comunicação. O uso de uma linguagem quadrada, com alto tom jurídico e incompreensível para a maioria das pessoas consumidor dará lugar a expressões do nosso cotidiano. A própria percepção sobre o que seria um banco vai mudar.
“A linguagem é importante. O banco não quer transmitir a mensagem que não é mais um banco. No futuro, ele será um resolvedor de necessidades. Ele estará no presente no cotidiano, falando a mesma língua do cliente. Não queremos ser gargalos para nada. Iremos encarar as transações e as necessidades financeiras de uma forma muito fluida”, explica Laura Chaves, líder de produtos financeiros do banco NEXT.
Na visão de Daniel, da CSU, o sistema financeiro precisa ficar de olho no chamado metaverso, ou seja, uma realidade virtual onde pessoas se relacionam de diferentes maneiras. E é justamente nesse admirável mundo novo que o sistema financeiro deverá estar presente.
“Estamos olhando para o Fortnite. Ele traz situações que não eram consideradas no passado, tais como unir o virtual e o real. Nesse mundo, ocorrem transações a partir de uma moeda, o v-buck, onde os jogadores compram skins ou roupas. Há ainda o Facebook, que está indo para o metaverso e tem planos de criar uma moeda virtual. O grande debate é como trazer tudo isso para o mundo real. Precisamos olhar para isso com muita seriedade”, afirma.
Já Lins entende que teremos uma mudança no paradigma da digitalização. Se há poucos anos a inovação ia na direção do mobile first, hoje, com a entrada da internet das coisas, o que está em jogo é contexto first. “Ou seja, o contexto do cliente. Penso que não iremos pensar em aplicativo, mas iremos pensar em interfaces: como a gente estará no espelho, no multimídia do carro, no micro-ondas e como que a gente vai falar de banking nessas interfaces”, explica.
Marcelo, da Digio, projeta que o consumidor terá um relacionamento com um número cada vez maior de plataformas, inclusive aquelas que oferecem serviços financeiros. “Essa questão do marketplace é muito importante. As empresas financeiras estão se tornando marketplaces e não apenas dos seus próprios produtos. Nesse cenário, parcerias serão importantes para oferecer um portfólio cada vez maior para o cliente”, afirma.
“Daqui para frente, mais do que nunca, precisaremos olhar para outras indústrias. Os racionais, muitas vezes, são parecidos e a inovação surge disso. É preciso construir soluções a partir de elementos que já existem”, conclui Laura.
Assista ao painel na íntegra abaixo ou escute o podcast aqui: